domingo, 28 de fevereiro de 2010

Os particos políticos não podem ter representação formal como partido político no Conselho de Saúde

Gilson Carvalho[1]

Os partidos políticos podem pleitear vaga nos Conselhos de Saúde? Minha pronta resposta sempre será que OS PARTIDOS POLÍTICOS NÃO PODEM TER REPRESENTAÇÃO NOS CONSELHOS DE SAÚDE COMO UM SEGMENTO DE PARTIDOS POLÍTICOS.
Cuidado para que não me demonizem. Não se trata de vedação a pessoas que – representando qualquer outro segmento ou entidade – tenham e professem uma fé política com filiação partidária. NADA CONTRA A MILITÂNCIA POLÍTICA PARTIDÁRIA DE TODO E QUALQUER CIDADÃO. ELA É SALUTAR E DEVE SER ESTIMULADA! A polêmica discussão é se devam ter nos Conselhos de Saúde vagas específicas para representantes dos partidos políticos: representação dos partidos da situação? Dos partidos da oposição? Dos de direita ou de esquerda? Repito: NADA CONTRA A PRESENÇA DE PESSOAS COM CONFISSÕES POLÍTICAS PARTIDÁRIAS. A MEU VER, MAS, TUDO CONTRA REPRESENTAÇÕES FORMAIS DE PARTIDOS POLÍTICOS.
Lembro que a vedação à presença de PARLAMENTARES E DE SEUS ASSESSORES, parece ter uma motivação semelhante, mas tem outra razão de ser. Outro motivo inquestionável que é a independência dos poderes. Em órgão do executivo é constitucionalmente vedada a presença de alguém do legislativo.
Aí vem o mais difícil: qual o argumento de vedação à presença dos partidos políticos no governo? Realmente não encontrei na legislação nenhum argumento explícito que vede a presença nos Conselhos de representantes dos partidos políticos na cota dos usuários pois na dos outros segmentos (governo, prestadores, profissionais) não se enquadraria.
Meu argumento mais forte tem como base a lei 8142. Esta lei cria oficialmente os Conselhos de Saúde e tratam de sua composição. Coloca em clareza meridiana a contraposição entre usuários de um lado e governo, prestadores e profissionais de outro. É isto que ela quis que se fizesse exigindo, inclusive, a paridade entre um e outro lado. Caso contrário não haveria oposição de partes. Haveria uma discriminação odiosa, uma assimetria indesejável, se os usuários (que não fossem governo, prestadores ou profissionais) não pudessem fazer parte daquele grupo e os daquele grupo pudessem passear no lado dos usuários! Seria a dominância dos mais fortes.
No fundo, a oposição das partes no Conselho se faz entre os PROVEDORES DE AÇÕES E SERVIÇOS DE SAÚDE (GOVERNO, PRESTADORES E PROFISSIONAIS) e de outro lado os CIDADÃOS EM SUA CONDIÇÃO DE USUÁRIOS. Quando se faz uma categorização qualquer, as categorias têm que ser mutuamente excludentes: você não pode colocar as partes indiferentemente de um lado e outro. Além deste problema de ordem legal e jurídica teríamos um problema de ética e de moral ao permitir que os segmentos governo, prestadores e profissionais pudessem ocupar o lugar de usuários. No Conselho é exatamente a representação destes segmentos (governo, prestadores e profissionais) que está em posição contraposta a de um usuário. Sua competência e responsabilidade é a de provedor (ainda que transitório) das ações e serviços de saúde. Por mais que se queira que os usuários sejam ativos, participantes, protagonistas nas ações de saúde, existem papéis extremamente distintos entre os dois grandes grupos.
No Estado de São Paulo existe, desde 1995 , na Lei 791, do ex-deputado Roberto Gouveia, o médico sanitarista grande formulador das leis paulistas de saúde, a vedação formal de que representem usuários os que tenham: vínculo, dependência econômica e comunhão de interesses com o governo, prestadores e profissionais. Aí tem a confirmação explícita e legal que não se podem confundir os dois lados. Vejamos na íntegra: “Lei 791-1995-SP Art.68 - Para garantir a legitimidade de representação paritária dos usuários, é vedada a escolha de representantes dos usuários que tenha vínculo, dependência econômica ou comunhão de interesse com quaisquer dos representantes dos demais segmentos integrantes do conselho.”
Mas, o que teria esta compreensão (preceito explícito legal em São Paulo) com a vedação à presença formal dos partidos políticos (não de cidadãos partidários, filiados a partidos políticos) no Conselho? Simples, o partido político do Prefeito, Governador ou Presidente não pode representar usuários pois, tem evidente vínculo e comunhão de interesse com o Governo. Se não pode um lado, seria insano que o lado oposto pudesse estar presente. Representação impossível dos partidos aliados e representação, dos demais partidos, possível e legítima?
Outro argumento é de que o lócus de atuação dos partidos políticos é na política geral, em cargos eletivos no Executivo e no Legislativo. Nos conselhos, de saúde e outros, a representação é de outros segmentos bem definidos e das entidades que os representem. Os partidos políticos defendem as partes que representam enquanto nos conselhos deva existir a política de representação do todo, sempre sob um critério que não seja o da política partidário. O lócus da representação dos partidos políticos é a chefia do executivo e seus comissionados e o do legislativo na Câmara ou na Assembléia.
Acho que o maior argumento seria o de que na conta dos usuários não devem estar categorias profissionais nem nenhuma outro tipo de representação específica, como os Partidos Políticos que tem por finalidade fazer política partidária. Os conselhos devem representar o mais livremente possível a sociedade, a comunidade, o bairro, o distrito. Partido Político tem fins específicos que não tem nada a ver com usuário da saúde; seu papel é fazer política partidária e o conselho não é lugar para isso.
A idéia e proposta dos Conselhos e suas representações de usuários é exatamente buscar entre estes os segmentos que mais representem interesses ligados especificamente a cada uma das áreas. No caso da saúde, no art. 194 tem a exigência de que pelo menos façam parte do Conselho os representantes dos empregados, dos empregadores e dos aposentados.
Por sua vez os partidos políticos são o lócus de geração de parlamentares e seus assessores que exercem funções que derivam de sua filiação partidária ou de sua vinculação política ao mandato eletivo cujos espaços privilegiados de atuação são o parlamento e a sociedade, sendo estes os instrumentos de sua fiscalização do executivo e não os colegiados de democratização da gestão no SUS, como os conselhos de saúde.
Cria-se aqui um outro argumento correlato: os partidos políticos ou exercem o poder ou o controlam no parlamento: como poderiam eles próprios estarem dentro de um Conselho, representando usuários que são os controladores da ação do legislativo e do executivo? Executivo e parlamento é local exclusivo dos partidos. Ninguém pode invadir seu espaço nem usurpar-lhe este poder. Os conselheiros de saúde, indicados pelos partidos políticos já estão dentro da representação do GOVERNO, nos conselhos. Aqueles partidos que são de oposição ao executivo terão seu espaço claramente definidos dentro do legislativo. Não caberia a eles outro espaço que é o dos profissionais, dos prestadores, dos usuários do Sistema Único de Saúde, além do Governo. Somos todos usuários, sim, mas aqui, além da presença obrigatória dos empregados, empregadores e aposentados pode-se e deve-se buscar outros segmentos que representem os interesses dos usuários no campo da saúde. Nem sempre todos os partidos políticos têm flexibilidade e independência necessária na análise das necessidades de saúde, seus condicionantes e determinantes e consequentemente nas proposições de soluções. Nem tudo de que parece transbordar democracia, sempre a pratica. Têm se mostrado altamente deletérias, dentro dos conselhos de saúde, as partidarizações: política, profissional, de pacientes e portadores de deficiência, de prestadores e até dos governos.
Vale lembrar que a mesma situação se aplica aos demais conselhos do Executivo. A presença ou mesmo pleito de presença, dos partidos políticos, não existe nos demais conselhos: educação, assistência social, mulher, segurança, idoso, criança e adolescente etc. etc. Por analogia, também fica indefensável no de saúde.
Não posso esquecer-me da história. A luta pelo direito à saúde foi feita por inúmeros cidadãos, filiados a partidos políticos. Muitos dos defensores da saúde pública, integral e universal, fizeram parte daqueles cidadãos brasileiros perseguidos pela ditadura militar por confissão partidária. A defesa ferrenha da saúde foi assumida por partidos políticos e seus filiados até se conseguir colocá-la no texto da CF de 1988 e depois em sua regulamentação pelas Leis 8080 e 8142.
Estou colocando este texto à avaliação aberta em busca de outras contribuições em defesa da tese de que, nos Conselhos de Saúde, não haja representação formal, oficial, como segmento, dos partidos políticos. Enfatizo: nada, absolutamente nada, contra a presença de cidadãos filiados e militantes de partidos políticos como é uma prática desejável de cidadania!

OBSERVAÇÃO: AGRADEÇO DE PÚBLICO A OPINIÃO DE GRANDES AMIGOS MEUS QUE CONTRIBUÍRAM COM IDÉIAS PARA QUE ESTE TEXTO NÃO SIGNIFICASSE APENAS OPINIÕES MINHAS PESSOAIS. COLOQUEI NA RODA E, OS OUVIDOS, CONCORDARAM E REFORÇARAM A ARGUMENTAÇÃO DESTA IMPOSSIBILIDADE DE PARTIDOS POLÍTICOS FAZEREM PARTE FORMAL DE UM SEGMENTO DO CONSELHO.

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